26 de abr. de 2010

Pai (poema de Fabio Weintraub).

   Não há nada de metafísico nisso, talvez seja um fenômeno ainda não nominado - embora percebido - mas, é fato para mim que certas leituras nos chegam em perfeito concerto com o que estamos vivendo no momento. Não acredito mais em coincidência nesses casos, acreditava no início, agora é certo - algo nos leva de encontro à leitura que precisamos.
   É o que ocorreu comigo quando conheci o poema Pai de Fabio Weintraub. Todos aqueles que acompanham à distância o envelhecimento do pai (e que gostam dele) deveriam ler esse poema tocante:


    Pai

    Desempregado há três anos
    no país do futuro

   Batendo perna nas ruas
   com o mostruário de meias

   Advinhando
   o signo da morena
   o ascendente da loira

   Jogando xadrez
   assobiando um samba
   colecionando borboletas
   descobrindo a fórmula exata
   da tinta para balão
   (tinta que não racha
   sobre a pele inflável)

   Contra as determinações médicas
   filando cigarro
   fazendo piada com a perna
   que pode ser amputada
   louvando as próteses modernas
   dizendo que morre antes disso
   que não vai dar trabalho
   que some de casa
   vai pro asilo

   Meu pai de novo ao volante
   guiando o negro Landau
  
   O velho e bom batmóvel
   rodando sem freio ou cinto
   o vento de Gothan no rosto
   minha cabeça no banco de couro

   Meu pai cantando alto
   limpo e bonito como só ele
   numa estrada clara
   sem pedágio ou limite
   de felicidade

  Fábio Weintraub
em "Novo Endereço" de 2002.
 

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