Não há nada de metafísico nisso, talvez seja um fenômeno ainda não nominado - embora percebido - mas, é fato para mim que certas leituras nos chegam em perfeito concerto com o que estamos vivendo no momento. Não acredito mais em coincidência nesses casos, acreditava no início, agora é certo - algo nos leva de encontro à leitura que precisamos.
É o que ocorreu comigo quando conheci o poema Pai de Fabio Weintraub. Todos aqueles que acompanham à distância o envelhecimento do pai (e que gostam dele) deveriam ler esse poema tocante:
Pai
Desempregado há três anos
no país do futuro
Batendo perna nas ruas
com o mostruário de meias
Advinhando
o signo da morena
o ascendente da loira
Jogando xadrez
assobiando um samba
colecionando borboletas
descobrindo a fórmula exata
da tinta para balão
(tinta que não racha
sobre a pele inflável)
Contra as determinações médicas
filando cigarro
fazendo piada com a perna
que pode ser amputada
louvando as próteses modernas
dizendo que morre antes disso
que não vai dar trabalho
que some de casa
vai pro asilo
Meu pai de novo ao volante
guiando o negro Landau
O velho e bom batmóvel
rodando sem freio ou cinto
o vento de Gothan no rosto
minha cabeça no banco de couro
Meu pai cantando alto
limpo e bonito como só ele
numa estrada clara
sem pedágio ou limite
de felicidade
Fábio Weintraub
em "Novo Endereço" de 2002.
Belo, belo....
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